
Durante a São Paulo Tech Week, o Deep Tech Meetup organizado pela Secretaria da Ciência, Tecnologia e Inovação de São Paulo reuniu gestores de parques tecnológicos e incubadoras para debater sobre como criar um ambiente propício ao desenvolvimento de deep techs. Foram abordados desde os entraves até as oportunidades do segmento que é marcado por ciclos longos de maturação, forte dependência de conhecimento científico e desafios regulatórios.
Uma característica das deep techs é o uso intensivo de tecnologia com conhecimento científico, e isso implica ciclos longos de desenvolvimento. Até que a solução chegue ao mercado, o fluxo de caixa sofre e o risco aumenta. E essa demora exige tanto paciência dos empreendedores quanto visão de longo prazo dos investidores.
Nelson Tadeu Cancellara, presidente do Parque Tecnológico de Sorocaba, entende que o fator tempo é o maior gargalo. Usualmente os empresários querem tudo para ontem, mas as deep techs precisam de anos para validar soluções. Para equilibrar a balança, um exemplo são as ações realizadas em Sorocaba, um ecossistema com 16 instituições de ensino superior, seis ICTs e até uma lei de sandbox que abre toda a cidade para testes. Ele explica que “o grande ponto importante é criar sinergias, entre aquelas empresas que necessitam de desenvolvimento, junto com todo esse ecossistema que nós temos”.
Programas sob medida
A questão regulatória foi destacada por Paula Lima, presidente CIETEC que é a gestora da Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da USP. A incubadora criou o programa DNA (Descoberta, Negócio e Aceleração), voltado a startups de base tecnológica, especialmente em saúde e biotecnologia. Foi realizada uma adaptação no ciclo de incubação para tempos mais longos e buscou-se uma aproximação com órgãos reguladores como a Anvisa. Ela descreve que já é possível ver uma movimentação no sentido de destravar entraves burocráticos: “não que deixem de ser rigorosas, mas que funcionem de uma forma mais fluida, principalmente quando a gente tá falando de startups”.
Paula ainda lembrou que a parceria com universidades da Cidade Universitária e com institutos como IPT e IPENN garante acesso a infraestrutura científica, criando importantes conexões entre empreendedores e pesquisadores.
Elasticidade no apoio
A flexibilidade é um fator importante para Mariana Gomes, gerente de Estratégia e Inovação do PIT, que apontou em seus modelos de pré-incubação, incubação e escala buscam dar elasticidade no tempo de desenvolvimento. A criação de uma diretoria de ciência e tecnologia para articular uma rede de 30 universidades e institutos é mais um ponto que tem feito a diferença no parque de São José dos Campos/SP.
Mariana ainda salientou a atenção com a questão financeira: “a gente tem um time dedicado à captação de recursos, para apoiar esses novos projetos, esses novos potenciais negócios para que eles tenham o escopo inicial com perspectiva de desenvolvimento no campo financeiro”. O parque também aposta em sandbox regulatórios, com foco em soluções de cidades inteligentes, criando um espaço de teste que conecta startups, governo local e investidores.
Mapeamento e acesso ao mercado
No Supera Park, em Ribeirão Preto, o caminho passa por dados. “Somos fissurados em mapeamento”, disse Eduardo Garbes Cicconi, gerente do Supera Park. O último levantamento identificou 348 startups na região, sendo 53% deep techs, principalmente em saúde, biotecnologia e agronegócio.
A partir desse diagnóstico, o parque estruturou ações de apoio em três frentes: acesso ao mercado (com rodadas de negócios, missões internacionais e parcerias com a Apex), infraestrutura tecnológica (laboratórios multiusuários e centros de biotecnologia) e apoio regulatório.
“As três principais dificuldades que elas elencaram, que para surpresa nossa, foi a conquista de mercado, a busca de parceiro de negócios e o acesso ao investidor. A regulamentação não aparece entre os três primeiros”, relatou Cicconi. Outro ponto de destaque é o perfil dos empreendedores: em geral, profissionais mais experientes, com 40 anos ou mais, que acumularam trajetória acadêmica em mestrado, doutorado ou pós-doutorado antes de empreender.
Políticas públicas
O debate abordou as políticas públicas, reconhecendo o papel estratégico do Estado de São Paulo na criação e manutenção dos parques tecnológicos, por meio do SPAI (Sistema Paulista de Ambientes de Inovação). Mas surgiram críticas sobre a falta de coordenação em ações internacionais e a necessidade de mais recursos para expansão da infraestrutura.
“Hoje nós estamos com um problema que é bom, mas é um problema. Hoje nós não não temos espaço disponível para receber mais empresas. E aí a grande dificuldade que nós temos hoje é conseguir recursos para ampliar o parque tecnológico”, destacou Cicconi.
O desafio cultural também precisa ser levado em conta. Cancellara defende maior participação de empresas privadas: “essa cultura da grande empresa que busca o apoio das instituições de desenvolvimento, ela quer um apoio pontual para resolver um problema específico, mas ela quer investir muito pouco”.
A cooperação entre os parques é defendida por Mariana que sugere que a secretaria estadual auxilie a “quebrar a lógica da competição e mudar para uma gestão de comunidades dentro de todos os nossos ambientes, instaurando essa lógica da cooperação de fato”.
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