Entre centenas de conteúdos que aconteceram no segundo dia do Web Summit Rio 2025, a participação do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, chamou a atenção. Entre os temas abordados em sua fala, inteligência artificial (IA) dominou boa parte do tempo, indo do uso pelo STF à legislação dessa tecnologia. O ministro entende não haver risco de substituição de juízes, mas acredita que em breve decisões judiciais mais simples em varas de primeira instância possam ser tomadas por IA.

Ao abordar os benefícios da inteligência artificial para o judiciário como um todo, Barroso ressaltou a quantidade de processos existentes no Brasil, sendo o País um dos recordistas mundiais nesse quesito contabilizando mais de 83 milhões de ações em andamento ao final de 2024. Em tom descontraído, o ministro fez um paralelo que, se estatística fosse uma ciência fácil, seria como dizer que 1 a cada 2 adultos no Brasil estaria em juízo. 

“Nossa litigiosidade é acima da média mundial e parte desses recursos chega ao Supremo. A Victor (uma das IAs do STF) identifica casos com precedentes e aí recurso não é admitido, tem a VitorIA (outro sistema) que agrupa processos por tema, e eliminamos conjunto. E, mais recentemente, criamos a MarIA, que recebe processos em 20 volumes e resume o conteúdo em 5 páginas. Usamos como ferramenta auxiliar do Supremo. Não vejo substituição (de juízes), mas não descarto decisões mais simples, de primeira instância, sendo tomada por IA, com supervisão humana”, detalhou Barroso.

Sobre regulamentação, o presidente do STF lembrou do projeto de lei em andamento no Congresso Nacional e comentou que existe uma resolução no Conselho Nacional de Justiça para disciplinar o uso de inteligência artificial especificamente no judiciário e com fins decisórios sem supervisão humana. Para ele, a principal dificuldade em regular a tecnologia reside na velocidade da transformação do mundo atual. “Temos de regular o fenômeno sem ter clareza do que vai acontecer num futuro muito próximo, olhamos, então, liberdades individuais, liberdade de expressão, discursos de ódio, ataques à democracia e temos de assegurar governança, transparência e supervisão em tudo que repercuta em esfera jurídica de outros seres humanos”, avaliou. 

Sem abismos

Ainda no âmbito da inteligência artificial, o ministro resumiu os desafios em três grandes pontos: em regulação seria acertar um ponto de equilíbrio entre preservação da liberdade de expressão, fundamental para democracia e dignidade humana, “mas mentira deliberada precisa ser reprimida”; para uso em julgamentos, com a decisão sendo produzida pela tecnologia, assegurar a supervisão humana, já que o direito exige o toque de humanização para não prejudicar a realização da justiça; por fim, um grande desafio, discutido inclusive no mundo corporativo, seria tratar a questão dos vieses para evitar que a tecnologia reproduza erros e falhas que temos em sociedade e queremos superar.

Saindo da IA e entrando no mundo das decisões judiciais, o ministro afirmou que a regra da proporcionalidade precisa ser seguida. Foi retomada durante o painel a discussão sobre o caso da suspensão do X no Brasil, mas Barroso afirmou que, diferentemente do que foi divulgado, a suspensão não se deu por conteúdo, mas pelo fato de empresa ter, na ocasião, retirado representante no País para não receber intimações.

“No Brasil, diferentemente de outros países, tivemos embate grande com extremismo e ameaça de golpe de Estado e o STF teve papel de oferecer resistência ao uso das plataformas digitais para preparação de golpe. A liberdade de expressão é fundamental na democracia, é preciso preservá-la, mas não podemos deixar que mundo caia num abismo com violação de direitos fundamentais”, comentou.

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