Catharine Grimes, Fundação Bristol Myers Squibb

Saúde é um desafio global. Mas quando o olhar se volta a países desiguais como o Brasil, o assunto fica ainda mais complexo. Um país que conta com ilhas de excelência convive com parte de sua população, sobretudo aquelas em áreas remotas, sem acesso ao básico. Quando falamos em doenças como câncer, a desigualdade em diagnóstico e tratamento é ainda maior. E é nesse tipo de território que entra o trabalho da Fundação Bristol Myers Squibb, que conta com projetos espalhados por diversas partes do mundo, incluindo o Brasil.

Em entrevista ao Coletivo Tech, a presidente da fundação, Catharine Grimes, falou sobre a visão de 2025, compartilhou resultados dos projetos no Brasil, como ações no Pará, Bahia e interior de São Paulo. A executiva também deixou claro, em diversos momentos, que esse tipo de trabalho é balizado em: parcerias com ongs e organizações locais, transferência de conhecimento, tecnologia e dados. A seguir, você confere os principais trechos da conversa.

Vitor Cavalcanti – Você poderia nos dar um panorama do foco de investimento da Bristol Myers SquibbFoundation para 2025?

Catharine Grimes – Em 2025, continuaremos a entregar nossa missão de melhorar a saúde global e entregar mais resultados em saúde para populações com restrição ao atendimento por meio de parcerias que desenvolvem capacidades em regiões-chave ao redor do mundo, incluindo Brasil. Por exemplo, uma das nossas prioridades é aumentar o acesso ao tratamento de câncer para populações excluídas, com forte ênfase em iniciativas de câncer de pulmão por meio do Multi-National Lung Cancer Control Program (MLCCP). 

Entendemos que esse acesso ampliado par ao tratamento de câncer de pulmão é extremamente desafiador. No Brasil, existem inúmeros gaps na disponibilização de tratamento nos quais estamos trabalhando para melhorar, como: diagnóstico precoce, acesso ao tratamento entre outros indicadores. 

VC – Como o Brasil está nessa estratégia?

CG – O Brasil é um foco central para nós em 2025 devido aos desafios de acesso à saúde existentes em todo território. Estamos comprometidos em trabalhar ao lado de organizações locais, entidades governamentais e provedores de saúde para atender a essas necessidades. Desde 2020, nossos esforços no Brasil estiveram concentrados em melhorar o diagnóstico precoce do câncer, expandir o acesso ao tratamento, melhorar a qualidade do tratamento, sobretudo, em populações com pouco ou nenhum acesso em regiões remotas. 

Essas áreas enfrentam os maiores obstáculos em termos de infraestrutura de saúde limitada, que resulta nos piores indicadores de saúde. Nosso objetivo é resolver esses gaps a partir da expansão do acesso ao tratamento de câncer para toda população brasileira. 

VC – Como você deve saber, o Brasil é uma sociedade muito desigual, onde você pode ter acesso aos tratamentos mais avançados em São Paulo e praticamente não encontrar o básico em regiões remotas no norte do País. Como a Fundação trabalha isso diretamente, especialmente falando sobre diagnóstico e tratamento de câncer? Poderia nos dar algum exemplo?

CG – Nós reconhecemos esses desafios de saúde em todo o mundo e trabalhamos para suprir o gap por meio do empoderamento de comunidades e do Sistema de saúde locais no intuito de criar um impacto duradouro. O Brasil não está imune a certos desafios enfrentados por algumas comunidades, particularmente quando falamos de câncer de pulmão ou mesmo outros tipos da doença. 

A Fundação apoia de forma ativa projetos que trabalham para levar o acesso à saúde e ao tratamento de câncer de qualidade para essas populações. Colaboramos com organizações em todo o Brasil para engajar comunidades locais diretamente, visitamos áreas remotas e formalizamos parcerias com agentes de saúde pública. Esses esforços são essenciais para ampliar o acesso ao diagnóstico precoce e ao tratamento, garantindo que pessoas de áreas isoladas recebam o cuidado necessário. Por meio dessa abordagem colaborativa, queremos avançar e melhorar o acesso à saúde, prover soluções sustentável para um tratamento de câncer melhor e, em última instância, melhorar os indicadores nacionais de saúde. 

Temos, por exemplo, uma parceria com o Projeto Saúde e Alegria (PSA), que atende moradores de comunidades rurais na região oeste do Estado do Pará. Por meio do Programa Saúde Comunitária, o PSA foca em melhorar o acesso de comunidades amazônicas isoladas ao Sistema de saúde. A iniciativa conta com expedições médicas que navegam por rios e canais e entrega um programa integral de assistência em saúde, incluindo avaliações de câncer cervical (também conhecido como câncer do colo do útero) e vacinas como a de combate ao HPV. O programa também se concentra na capacitação de profissionais de saúde que trabalham nessas áreas.

VC – Você acredita que essas iniciativas podem ajudar países como o Brasil a resolverem esse gap em tratamento de câncer? Você poderia compartilhar alguns resultados?

CG – Ações para desenvolver capacidades e melhorar o acesso ao cuidado são cruciais para sanar esse gap em tratamento de câncer no Brasil. Um exemplo é nossa parceria de sucesso para um projeto móvel de rastreamento de câncer de pulmão em áreas remotas da Bahia, por meio da qual o Senai Cimatec e a Propulmão conseguiram chegar em populações de alto risco, como fumantes e ex-fumantes (o projeto idealizado pela Propulmão com apoio da Fundação é conhecido como Carreta da Saúde Respiratória e funciona praticamente como um ambulatório que percorre áreas remotas onde o diagnóstico tende a ser precário). Até o momento, esse projeto conduziu mais de 1500 análises utilizando tomografia computadorizada de baixa dose nessa unidade móvel. 

Também apoiamos iniciativas focadas na detecção precoce de câncer cervical, por meio de rastreamento nas regiões Norte e Nordeste, onde a mortalidade por essa doença é particularmente alta. 

VC- Quando falamos sobre territórios remotos, entendo que o uso das parcerias seja algo fundamental, correto? 

CG – Certamente, formar parcerias com organizações locais é peça central em nosso trabalho e essas colaborações são vitais para as áreas remotas. A Fundação Bristol Myers Squibb tem um longo histórico em colaborações com Ongs e organizações comunitárias para garantir que nossas iniciativas sejam culturalmente relevantes, sustentáveis e efetivas. Ao entregar expertise e networking para os parceiros locais, nós temos a possibilidade de melhor compreender os desafios específicos enfrentados pelas comunidades e desenhar nossas intervenções em linha com essas necessidades, o que, de certa forma, provoca a real mudança nessas regiões.   

VC – Como a tecnologia ajuda ou poderia ajudar a ampliar o impacto do trabalho da Fundação?

CG – Tecnologia é crucial para expandir o impacto de nossas ações, particularmente em regiões desassistidas. Uma das áreas onde aplicamos tecnologia para ampliar o impacto da Fundação é nos programas de telemedicina, que promove e melhora o acesso aos cuidados do câncer para pacientes de áreas remotas. Ao utilizar plataformas de telemedicina, organizações parceiras conectam pacientes de comunidades remotas com especialistas, suplantando as barreiras geográficas que antes impediam o acesso ao acompanhamento.

Temos explorado também novas oportunidades que entregam dados e tecnologia para acelerar o processo de rastreamento, permitindo detecção precoce e intervenção médica acelerada para populações de alto risco. Ao aproveitar tecnologia prática e acessível, podemos garantir que mais pessoas espalhadas pelo Brasil possam ter o acesso a tratamentos críticos garantidos. 

VC – Você pode compartilhar algum caso?

CG – Uma das iniciativas mais notáveis da Fundação Bristol Myers Squibb no Brasil é nossa colaboração com o Hospital Amor de Barretos (interior do Estado de São Paulo). Com nosso suporte, o hospital ajudou a reduzir o tempo de início do tratamento de câncer e superou barreiras como desafios de transporte e melhorou a adesão ao tratamento.

Além disso, o Programa de Teledermatologia focado em câncer de pele que a Fundação apoiou o hospital impactou 720 pacientes. Todas as fotografias de suspeita de câncer foram revisadas por especialistas. Quando o melanoma estava entre as principais suspeitas, pacientes eram encaminhas para uma consulta presencial com especialista em menos de 10 dias. Se após a consulta a suspeita do melanoma persistisse, o paciente poderia ser encaminhado para cirurgia em até 20 dias após o diagnóstico por imagem. Esses dados não apenas mostram como tecnologia e logística podem ampliar o acesso, mas também contribuem para atendimento à legislação brasileira de garantir o tratamento entre 30 e 60 dias. 

VC – Além de Brasil e Estados Unidos, você mantém projetos na África e eu vi que existe uma iniciativa focada em crianças. Como estão os resultados por lá?

CG – Temos uma história de 25 anos de suporte a iniciativas de saúde pediátrica na África Subsaariana. Em 1999, no auge da epidemia de HIV/Aids, mobilizamos parceiros para treinar dezenas de milhares de trabalhadores da saúde local com o intuito de dar suporte a mais de 375 mil mães e crianças. 

Em 2016, colideramos o estabelecimento de um novo programa na região, o Global HOPE (Excelência em Oncologia-Hematologia Pediátrica), para melhorar o acesso ao tratamento para crianças com câncer e outros problemas hematológicos. O Global HOPE ajudou a lidar com altas taxas de mortalidade e com o sofrimento de crianças com câncer e doenças do sangue na África Subsaariana. Treinamos 35 dos primeiros médicos especialistas em cancer pediátrico e doenças hematológicas do continente africano e 180 enfermeiros pediátricos em todo o leste e sul da África. O programa apoia cerca de 2.500 crianças diagnosticadas com câncer todos os anos em oito centros terciários em seis países e já prestou atendimento a mais de 23.000 crianças desde o seu início.

A mais recente iniciativa da Fundação na região, lançada em outubro de 2024, está apoiando crianças com doença falciforme (SCD), que leva a mais de 500 mortes infantis na região todos os dias. Ao alavancar a infraestrutura de saúde que ajudamos a construir ao longo de mais de duas décadas e, mais recentemente, por meio do Global HOPE, este programa está integrando intervenções que salvam vidas em instalações de cuidados primários e equipando os profissionais de saúde locais para fornecer cuidados urgentemente necessários para crianças em áreas carentes.

VC – Saúde é um dos grandes desafios da sociedade atual. Você vê alguma luz no futuro para minimizar esse problema?

CG – Embora o acesso aos cuidados de saúde continue sendo um dos desafios globais mais significativos, nós da Bristol Myers Squibb Foundation continuamos dedicados a superar as divisões que causam resultados ruins de saúde e esperamos que os esforços colaborativos continuem a trazer mudanças significativas. Mais especificamente, somos inspirados pelo uso crescente de soluções digitais de saúde, telemedicina e inteligência artificial (IA) que têm o potencial de preencher ainda mais lacunas na prestação de cuidados de saúde e em um ritmo acelerado, especialmente em regiões carentes. O que me dá confiança para compartilhar esse sentimento de esperança é que há um crescente reconhecimento global da necessidade de melhorar o acesso aos cuidados, o que pode impulsionar mudanças sistêmicas nos próximos anos.

Sem comentários registrados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *