
O Brasil começa a dar passos consistentes rumo à construção tecnológica na fronteira da computação quântica. A avaliação é do econofísico Luiz Augusto, professor de Computação Quântica na FGV e pesquisador do Venturus, instituto de ciência e tecnologia sediado em Campinas (SP). Durante encontro no inovabra, o professor explicou como está sendo construído um computador quântico nacional, com pesquisa desenvolvida na Unicamp e no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF).
O projeto, apoiado por FAPESP, CNPq, MCTI e CAPES, é considerado um marco para a ciência aplicada no País. A fabricação própria de chips quânticos é um processo complexo, mas possível com a estrutura do instituto. A meta é consolidar, em território nacional, o domínio de uma tecnologia que deve redefinir os padrões de processamento e segurança de dados nas próximas décadas.
Segundo Luiz Augusto, o coração de um computador quântico está no chip fabricado a partir de wafers de silício. Esse material é utilizado pela pureza cristalina e pela compatibilidade com processos industriais já dominados. Sobre ele são depositadas camadas de alumínio ultrapuro, formando as chamadas junções Josephson — componentes que transformam bits clássicos em qubits, as unidades fundamentais da computação quântica.
Engenharia de alta complexidade
Para que esses qubits funcionem, é necessário atingir temperaturas próximas de 1 milikelvin, mil vezes mais frias que o espaço sideral. Essa condição extrema é alcançada por meio de um refrigerador de diluição, que utiliza misturas de hélio-3 e hélio-4 para resfriar o sistema de forma gradual e precisa. O equipamento, importado e adaptado por engenheiros brasileiros, é protegido por múltiplas camadas de escudos térmicos e magnéticos, feitos de ligas metálicas como alumínio, cobre e níquel-ferro.
O controle do qubit, no entanto, é o ponto mais sensível do processo. Como o chip opera em temperaturas criogênicas, enquanto os sistemas de comando estão à temperatura ambiente, é preciso modular sinais de micro-ondas com extrema precisão. Esses sinais percorrem cabos supercondutores de nióbio e titânio, passam por sucessivas etapas de amplificação e são filtrados por cristais de quartzo e materiais absorvedores de micro-ondas. Nada é trivial nesse processo, conforme relata Luiz Augusto: “é uma engenharia muito difícil fazer, é muito complicado e muito sensível. Mas o Brasil já consegue fazer isso”.
Além do domínio técnico, o pesquisador chama atenção para outro desafio: formar profissionais capacitados. Para treinar alguém que realmente domine a tecnologia leva de cinco a sete anos e a criação de centros de pesquisa e programas de formação avançada é essencial para sustentar o avanço brasileiro no campo quântico.
Luiz Augusto defende que o país precisa escolher se quer apenas utilizar tecnologias estrangeiras ou produzir seus próprios computadores quânticos. Segundo ele, depender de soluções externas não é uma opção, especialmente diante da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que restringe o envio de informações sensíveis ao exterior.
Centro de pesquisa quântica

O Venturus abriga um centro de excelência em computação quântica responsável por testar materiais, projetar circuitos e integrar as etapas de fabricação. Atuando há mais de 30 anos como instituto privado de ciência e tecnologia sem fins lucrativos, a instituição colabora com universidades, startups e grandes corporações (como Microsoft e Serpro), marcando presença em áreas como criptografia pós-quântica e bioinformática quântica aplicada.
Daniel Moraes, head de Tecnologias Emergentes do Venturus, explicou que a parceria com a QuERA Latam, fabricante de computadores de átomos neutros, possibilita o acesso a processadores quânticos reais e capacidade local para simular até 36 qubits, combinando pesquisa teórica e validação experimental.
A atuação do Venturus também se expande para projetos de impacto ambiental e social. Em colaboração com a startup QuaTI, desenvolve sistemas de prevenção de catástrofes climáticas baseados em algoritmos quânticos. Já o projeto Plant Genomics, ligado ao Open Quantum Institute e apoiado pela ONU, aplica computação quântica à edição genética de plantas, com foco em segurança alimentar e redução de consumo energético em biotecnologia.






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