
Estudos de todos os tipos sugerem que tecnologia aplicada à educação pode promover uma série de melhorias. Destaca-se muito a melhor compreensão do conteúdo por parte do aluno ou mesmo a possibilidade real de personalização do ensido por parte dos professores. Mas enquanto se defende algo sem uma estratégia de fato, o país convive com 29% de sua população afetada pelo analfabetismo funcional, ou seja, dificuldade em aplicar conhecimentos de leitura, escrita e matemática, de acordo com informações do Inaf (Indicador de Analfabetismo Funcional).
A defesa da tecnologia e o retrato da realidade brasileira só demonstra o tamanho da oportunidade que o País tem de fazer uma virada e dar um salto de produtividade e qualidade em sua educação. O tema esteve em evidência no Gramado Summit 2025, em apresentação conduzida pela gerente do Instituto Sesi de Formação de Professores, Eclea Conforto. Ela que é economista e educadora, se tornou grande defensora do uso da inteligência artificial na educação. “Hoje é impossível transformar pessoas sem uso de recursos tecnológicos”, ponderou.
A especialista ressalta, no entanto, que não se pode começar essa discussão pela ferramenta, já que tecnologia é meio e não o fim e precisa ser operada por alguém, especialmente, quando se fala de IA. O departamento do Sesi no Rio Grande do Sul desenvolveu uma formação de professores para que o uso da tecnologia acontecesse de forma estratégica, evitando erros do passado quando tentou-se impor determinados padrões e metodologias que não funcionavam em sala de aula.
O interessante do trabalho é que, antes mesmo de ouvir professores, eles decidiram interagir com alunos e familiares. Um dos exemplos utilizados foi de uma aluna do 9º ano que relatou usar o ChatGPT com frequência. Entre as atividades estava tornar o conteúdo discutido em sala mais palatável, mais didático, envolvendo inclusive exemplos com personagens de filmes e séries. Parte da dificuldade da aluna estava também em problemas de concentração, queixa cada vez mais comum, especialmente nas cidades de maior porte. Além disso, a aluna executou via IA simulações de prova e, como resultado, melhorou suas notas.
Neste caso, como explicou Eclea, o que aconteceu é que a aluna usou o conteúdo do professor, adaptou à realidade dela com a ferramenta e melhorou o processo de aprendizagem. “Onde está esse professor?”, questionou a especialista. “O professor está formado em modelo tradicional. E todos passaram por esse modelo, que é centrada no conteúdo. Mas tudo está disponível na rede. A transmissão de conteúdo terminou. Quem fez pedagogia, aprendia o que seria aplicado e ignorava o contexto em que estaria inserido”, explicou, ao advogar por um processo formativo que respeite contexto e realidades distintas.
Se adaptar ao tempo é necessário
Para Eclea existe um descolamento da realidade que precisa ser revisto urgentemente. O caso da aluna levado como exemplo é um entre milhões e não se restringe aos ensinos fundamental e médio. Dados de uma pesquisa da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (Abmes), mostra que 71% dos estudantes entrevistados utilizam IA frequentemente, 29% o fazem diariamente e 42% semanalmente.
Diante da realidade é preciso se repensar a maneira de ensinar. E aqui não é dizer que não se ensinará determinadas coisas, o que está em questão são metodologias e a maneira como professor e aluno interagem com tecnologias como IA. Até porque, como lembrou o astrofísico Neil deGrasse Tyson, aprender matemática, física e outras disciplinas tradicionais contribui para que nosso cérebro crie formas de resolver problemas.
Além disso, hoje se sabe que em uma sala com 25 alunos, de 10% a 15% pode ter algum transtorno, dificuldade de aprendizagem e o ensino personalizado se torna algo fundamental. E como fazer isso sem o uso de tecnologia? Não se faz, até porque essa personalização é prometida há anos. “Como IA ajuda? Ela permite montar ferramenta de diagnostico, tabular o dado e criar estratégia e isso alivia o professor. Sai da sequência fixa, para trilhas. Com o perfil mapeado, você monta trilhas específicas de acordo com perfil de aprendizagem e isso muda a vida de quem recebe”, reforçou Eclea.
O bom uso da IA auxilia o aluno até em casa. Tome como exemplo, algo que ainda é bastante comum no Brasil: um aluno de escola pública chega em casa com diversas atividades que demanda algum auxílio. Mas, e casa, ele convive com avós analfabetos que não conseguem ajudar. Nesse sentido, a IA pode ajudar no processo de aprendizagem autônoma, entra como suporte quando acaba o horário da aula.
Para Eclea, no entanto, tudo começa pela formação, não se pode baixar uma resolução e esperar que a mágica da IA aconteça. “Formação que ignora presente do aluno não prepara para futuro da escola. Formação que ignora professor como aprendi não gera transformação”, refletiu a especialista. Mais do que nunca, o papel do professor é de um grande curador e que, com treinamento adequado, conseguirá extrair os benefícios da tecnologia.
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